Governo amarga gasto com leite condensado

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Na cena política nacional, o leite condensado ganhou destaque recente como protagonista do peculiar café da manhã do presidente Jair Bolsonaro. Desde a campanha eleitoral de 2018, Bolsonaro difunde o gosto matinal pela combinação do pão francês com a mistura cremosa formada por leite e açúcar. Nesta terça-feira, 26, o produto se tornou um dos temas mais comentados do Twitter após o site Metrópoles mostrar que a administração federal – o que inclui de ministérios a autarquias – gastou mais de R$ 15 milhões em recursos públicos para comprar o doce em 2020.

O valor é, por exemplo, cinco vezes superior a tudo que o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) recebeu para fazer o monitoramento por satélite de toda a Amazônia, Pantanal e demais regiões do País – R$ 3,2 milhões no mesmo período, segundo dados levantados pela consultoria Rubrica.

Nos últimos dois anos, o Inpe – principal órgão federal responsável pelas pesquisas espaciais e monitoramento -, o Ibama e o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) tiveram seus orçamentos reduzidos, o que comprometeu a capacidade de o governo realizar ações estruturais de proteção, fiscalização e combate do desmatamento nas florestas nacionais – a Amazônia registrou volume recorde de queimadas no ano passado.

Os gastos alimentícios do governo federal, que somaram mais de R$ 1,8 bilhão em 2020, entraram na mira da oposição. Parlamentares formalizaram uma representação no Tribunal de Contas da União (TCU) pedindo a abertura de investigação sobre as compras do Executivo.

Segundo o site Metrópoles, o gasto global do Executivo federal com alimentos e bebidas registrou um aumento de 20% em relação a 2019. Neste total estão ainda despesas de cerca de R$ 2,2 milhões com chicletes e R$ 32,7 milhões com pizza e refrigerante, por exemplo.

No ranking de memes na internet, porém, nenhum gasto superou a aquisição de leite condensado. O doce também era o mais buscado no serviço que contabiliza as pesquisas diárias feitas no Google.

‘Supérfluo’

Em documento protocolado no TCU, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e os deputados federais Tabata Amaral (PDT-SP) e Felipe Rigoni (PSB-ES) argumentam que o aumento das despesas fere o princípio da moralidade administrativa. “Em meio a uma grave crise econômica e sanitária, o aumento de gastos é absolutamente preocupante, tanto pelo acréscimo de despesas como pelo caráter supérfluo de muitos dos gêneros alimentícios mencionados”, diz um trecho da representação.

Representantes do PSOL, o deputado David Miranda (RJ) e as deputadas Fernanda Melchionna (RS), Sâmia Bomfim (SP) e Vivi Reis (PA) protocolaram uma ação para que o procurador-geral da República, Augusto Aras, abra investigação sobre os gastos de R$ 1,8 bilhão.

Nas redes, a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) escreveu: “O leite condensado do @jairbolsonaro. É a versão atual da elba do Collor. Impeachment NELE!”, em uma referência ao caso do veículo Elba, pivô do processo de impedimento do ex-presidente.

Procurado nesta terça-feira pela reportagem e questionado sobre os gastos com alimentos, o governo federal não havia se manifestado até a publicação desta matéria. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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Gasto de R$ 15,6 milhões em leite condensado é de todo o Executivo, não de Bolsonaro

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Publicações nas redes sociais distorcem o conteúdo de um levantamento do portal Metrópoles sobre as compras de alimentos feitas pelo governo federal. A reportagem mostra que o Executivo gastou R$ 1,8 bilhão em itens de alimentação, sendo R$ 15,6 milhões em leite condensado. Postagens enganosas no Facebook e no Twitter dão a entender que este último valor foi gasto apenas pelo presidente Jair Bolsonaro e sua família — mas todos os órgãos da administração federal, incluindo ministérios e autarquias, entram na conta.

Leitores solicitaram a checagem deste conteúdo por meio do WhatsApp do Estadão Verifica, 11 97683-7490.

Leia Também Bolsonaro xinga a imprensa por divulgar gasto de R$ 15 milhões com leite condensado

As informações usadas na reportagem do do núcleo de jornalismo de dados do Metrópoles são do Painel de Compras atualizado pelo Ministério da Economia e mostram esse e outros gastos em compras com valor acima de R$1 milhão. O total gasto em alimentos em 2020 representou aumento de 20% em relação a 2019, de acordo com o levantamento.

Do valor de R$15,6 milhões gastos em leite condensado, R$ 14,2 milhões foram empregados pelo Ministério da Defesa. Em seguida, vêm os ministérios da Educação (R$ 1 milhão), da Justiça (R$ 327 mil) e da Saúde (R$ 61 mil). Ao Metrópoles, a Defesa afirmou que os gastos com alimentação são maiores porque o órgão é responsável pela comida do efetivo das Forças Armadas, referente a cerca de 370 mil pessoas.

Apesar das postagens nas redes sociais dizerem que Bolsonaro gastou sozinho R$ 15 milhões em leite condensado, o Painel de Compras não apresenta despesas alimentares da Presidência da República. De acordo com a base de dados do Ministério da Economia, o Planalto gastou R$ 14,9 milhões em 2020, principalmente com itens de segurança e transporte. Neste valor estão incluídos gastos com microcomputadores (R$ 5.916.295,00), automóveis (R$ 3.446.805,99) e carros blindados (R$ 2.151.405,99).

Procurado pelo Estadão Verifica, o Ministério da Economia não comentou sobre a finalidade dos itens comprados pelo Executivo no último ano e destacou que as opções de aquisições são de competência de cada órgão.

O Aos Fatos também publicou uma verificação sobre este assunto.

Bolsonaro rebate gasto com leite condensado com xingamento à imprensa

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O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) rebateu hoje as críticas sobre os gastos com leite condensado no Executivo com ofensas à mídia e o compartilhamento de um texto que tenta justificar as despesas. Bolsonaro fez os xingamentos à imprensa durante um almoço em uma churrascaria de Brasília, em evento com a presença de ministros como Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Gilson Machado (Turismo), além de personalidades que apoiam o presidente.

Ontem, as redes sociais e parlamentares de oposição repercutiram uma reportagem do portal Metrópoles, que apontava gastos do Executivo com alimentos supérfluos como chicletes, bombons, e, principalmente, leite condensado, que mais chamou a atenção por ser um item que o presidente da República gosta de passar no pão no café da manhã.

Segundo a matéria, o Executivo gastou R$ 15,6 milhões só com leite condensado em 2020.

“Quando eu vejo a imprensa me atacar, dizendo que eu comprei 2,5 milhões de latas de leite condensado”, disse Bolsonaro durante o almoço no restaurante localizado na Vila Planalto. “Vai pra puta que o pariu!”, completou depois, sendo aplaudido pelos presentes, que incluíam os cantores Amado Batista e Rick, da dupla sertaneja Rick & Renner.

O presidente Bolsonaro fechou uma churrascaria hoje em Brasília para um evento privado com artistas.

Tive acesso às imagens.

Ele comentou a polêmica com a compra de alimentos. Disse que o leite condensado é pra “enfiar no rabo da imprensa” e defendeu o gasto com chicletes. pic.twitter.com/fykEhjkMfO – Samuel Pancher (@SamPancher) January 27, 2021

“É pra enfiar no rabo de vocês aí da imprensa”, disse ainda Bolsonaro, exaltado, chamando a mídia brasileira de “imprensa de merda”.

Já o texto em sua defesa foi publicado no canal do presidente no Telegram, para onde Bolsonaro tem migrado boa parte dos seus apoiadores na internet. A publicação de um seguidor de Bolsonaro nas redes sociais justificava os gastos com leite condensado com a alegação de que eles vieram em grande parte do Ministério da Defesa e da Funai.

Colocando o último prego no caixão da narrativa.

Também é bom lembrar que o consumo de leite condensado foi maior em governos anteriores, em que o exército teve um número maior de operações (Intervenção no Rio de Janeiro, Copa do Mundo e missões de paz) pic.twitter.com/Mu2oTJmKrs – oiluiz (@oiIuiz) January 27, 2021

A explicação diz que os órgãos do Executivo fazem uso do produto “em locais distantes e pouco acessíveis”, onde “não é viável o transporte e o armazenamento de leite fresco, que estraga rapidamente”.

Na reportagem que apontou os gastos totais de R$ 1,8 bilhão com alimentação no ano passado, a pasta da Defesa e a Funai foram identificadas entre os maiores compradores de leite condensado.

Mais tarde, em conversa com apoiadores na porta do Palácio da Alvorada, Bolsonaro voltou a tratar do assunto. “Uma sucessão de erros, de equívocos levou a isso”, disse. Ele justificou que os alimentos adquiridos são usados na alimentação de “centenas de milhares” de pessoas.

O presidente também ironizou as críticas sobre os gastos: “tenho um milhão de latas de leite condensado no Alvorada. Mesmo que eu tome 500 latas de leite condensado por hora não daria conta do recado”.

Gasto 20% maior do que em 2019

O relatório de gastos com a alimentação do Executivo foi obtido por meio do Painel de Compras atualizado pelo Ministério da Economia. Segundo cálculos da reportagem, que considerou apenas itens que somaram mais de R$ 1 milhão, o montante foi 20% maior do que os próprios gastos do governo Bolsonaro feitos em 2019.

Além da soma com leite condensado, outros itens que chamaram a atenção foram as compras com chicletes (R$ 2,2 milhões) e pizza e refrigerante (R$ 32,7 milhões se somados).